Estrada de ferro Leopoldina

Entre em seu vagão, tome seu assento e siga conosco por essa viagem sob trilhos

Desde a silhueta icônica dos torradores Atilla criada por Tomaz Emerick há 35 anos, que muitos clientes associam ao formato de uma locomotiva, até a lembrança persistente da Estrada de Ferro Leopoldina ainda pulsando nos corações das Matas de Minas, tudo se une nesta obra assinada pelo artista plástico Robson Emerick.

Especialista em dar nova vida aos metais, Robson encontrou em peças de descarte de nossos torradores a matéria-prima de sua criação: uma locomotiva que nasce daquilo que antes parecia fim, mas que, pelas mãos do artista, tornou-se início. O que antes era resíduo industrial, hoje se ergue como poesia forjada em metal. Sucata transformada em símbolo, lembrança transformada em escultura.

Não é por acaso que a locomotiva foi a forma escolhida. O café e os trens, compartilham de um mesmo enredo na história brasileira. Foi o café que exigiu caminhos mais rápidos, que pediu estradas mais largas, que clamou por ferro e vapor para atravessar serras e vales mineiros. A Estrada de Ferro Leopoldina começou a ser construída em 1874, financiada por investidores ingleses, ainda sob o governo imperial de Dom Pedro II.

A inauguração de seus primeiros trechos trouxe esperança e velocidade ao coração das Matas de Minas, ligando produtores e comerciantes aos portos da capital, Rio de Janeiro. No início do século XX, já na República, a Leopoldina se consolidou como uma das maiores malhas ferroviárias do Brasil, chegando a mais de 3.200 km de trilhos, sendo quase toda dedicada ao transporte de café. 

Era o tempo em que cada saca que deixava a estação carregava não só grãos, mas também o destino econômico e social de uma região inteira. Minas crescia ao som do apito das “maria-fumaças”.

Com o passar das décadas, especialmente após os anos 1950, a ferrovia foi cedendo espaço às rodovias. A política nacional de transportes, do governo Juscelino Kubitschek, priorizou a malha rodoviária como símbolo de modernidade. A Leopoldina, antes imponente, começou a perder fôlego, encerrando suas atividades em 1965. Trilhos foram abandonados, estações se silenciaram, e os caminhões passaram a carregar o peso que antes era dos vagões. Ainda assim, no imaginário brasileiro, o trem nunca deixou de existir.

Há nele uma cadência nostálgica, um ritmo que se assemelha à respiração do tempo. Viajar de trem era atravessar paisagens e memórias, era ver o país passar devagar pela janela, era sentir que cada apito guardava em si uma canção, uma poesia. Como escreve Manuel Bandeira em seu poema, Trem de Ferro:

“Café com pão

Café com pão

Café com pão

Virge Maria que foi isto maquinista?

Agora sim:

Café com pão

Agora sim:

Voa, fumaça

Corre, cerca

Ai seu foguista

Bota fogo

Na fornalha

Que eu preciso

Muita força

Muita força

Muita força

Oô…

Foge, bicho

Foge, povo

Passa ponte

Passa poste

Passa pasto

Passa boi

Passa boiada

Passa galho

De ingazeira

Debruçada

No riacho

Que vontade

De cantar!

Oô…

Essa coxa

Essa sanfona

Essa zia

Essa fubeca

A gulgulha

Na boca

De quem canta

Esse coco

Esse reco

Esse foguete

Rangente

De uma boca

D’esse foco

Esse mundo

Rodador

Oô…”

O café é mais que apenas um grão. É linguagem, é cultura, é tecido social. Nas Matas de Minas, o café moldou cidades, ergueu igrejas, construiu escolas e formou tradições que seguem vivas até hoje. É trabalho e também é arte, é suor e também é orgulho. Foi ele que sustentou grande parte da chamada “política do café com leite”, que uniu São Paulo e Minas Gerais no início do século XX, figurando desde os tempos antigos, a agricultura mineira com força no cenário nacional.

E se outrora a política se apoiava nesse binômio, hoje o café de Minas se orgulha de sua evolução: mecanização crescente, técnicas modernas de beneficiamento, pesquisa e aprimoramento genético, cooperativas fortes e, acima de tudo, produtores incansáveis e dedicados. Cada xícara carrega não apenas tradição, como também inovação. Não apenas história, mas também o futuro das Gerais.

Hoje, o escoamento do café se faz majoritariamente pelas rodovias. Caminhões seguem diariamente levando a hospitalidade mineira ao mundo, mas o imaginário ferroviário continua latente. O trem, com seu apito distante, ainda ecoa na memória coletiva. Sendo símbolo de progresso e de saudade, de partida e de chegada, de movimento e de poesia.

Comparar a malha ferroviária de ontem com a atual é revisitar uma parte perdida de nossa identidade nacional. Há quem diga que o Brasil se esqueceu dos trilhos, talvez… Mas a arte tem o poder de relembrar. A locomotiva de Robson Emerick é, assim, mais que ferro moldado: é um chamado ao resgate de memórias, é a lembrança de que o café e o trem foram, juntos, a engrenagem que moveu o coração de Minas.

É com esse espírito que nós, da Atilla, convidamos você a contemplar esta obra durante a Semana Internacional do Café (SIC), em Belo Horizonte. Venha ao nosso estande, se aproxime da locomotiva e deixe que ela te conte histórias de grãos, xícaras, trilhos e lembranças. Porque, assim como o café, a arte tem o poder de unir o passado ao presente. E, no apito distante de uma locomotiva feita de sucata, ainda podemos ouvir a grandeza que reverbera dos cafés de Minas Gerais.